Enterro de uma negra - (Pintura de Debret) |
No dia 24 de outubro de 1836, entrava em vigor uma lei em Salvador que proibia os tradicionais enterros no interior das igrejas e dava a uma companhia privada o monopólio dos enterros por trinta anos, no cemitério chamado de Campo Santo. Insatisfeitos com a postura do governo da Bahia, um dia após a lei ser outorgada, as irmandades católicas se organizam e vão protestar em frente ao palácio do governo provincial.
As irmandades eram organizações responsáveis pela devoção festiva de santos específicos e seus membros estavam reunidos de acordo com a classe que pertenciam na sociedade. Haviam irmandades predominantes, mas não exclusivas, de brancos, mulatos e pretos, ricos e pobres. As irmandades se responsabilizavam pelos funerais dos seus membros, chegando a enterras pessoas estranhas por um valor determinado.
No dia 25 de outubro de 1836, as irmandades marcham em direção ao palácio provincial, convidando seus membros e o público em geral para protestar contra a nova lei. A multidão se reuniu, vestidos a caráter, carregando cruzes e bandeiras referentes a sua irmandade, o protesto tomou tal proporção que polícia estimou cerca de duas a quatro mil pessoas. Devido a imensa multidão que se postou frente ao palácio, o presidente da província, Francisco de Sousa Paraíso, aceitou negociar com os principais representantes das irmandades. Devido a pressão exercida, Paraíso decide convocar uma reunião extraordinária da Assembléia Provincial para rever a lei, acalmando em parte, os ânimos dos protestantes e enquanto a reunião não ocorria para dar o parecer final, os enterros continuariam sendo nas igrejas.
Mesmo com a decisão do governador que atendia, por enquanto, a vontade do povo, um grupo aproximou-se do escritório da companhia do cemitério gritando “vivas às Irmandades e morras aos Pedreiros livres”, em seqüência apedrejaram o lugar. Em seguida, a multidão marchou sentido ao Campo Santo, que ficava a três quilômetros do centro da cidade, lá a destruição foi praticamente total. Os policiais que acompanharam tudo de perto não puderam fazer nada, a quantidade de pessoas era imensa e usar a força contra homens e mulheres que carregavam cruzes seria politicamente incorreto. A manifestação só teve fim a noite, o cemitério estava destruído e o povo contente. Assim ocorreu a Cemiterada de1836 na Bahia.
“A Cemiterada é um exemplo do conflito entre tradição e reforma, tão comum na formação do capitalismo e dos estados nacionais modernos. Mais especificamente, ela pode ser entendida à luz das mudanças de atitudes frente a morte e aos mortos, em parte do mundo católico, entre meados do século XVIII e meados do XIX, aproximadamente.” (REIS, 2006, p. 229)
Referencias bibliográficas
REIS, João José. A morte é uma festa: Ritos fúnebres e revolta popular no Brasil do século XIX. São Paulo: Companhia de Letras, 1991.
MATTOSSO, Kátia. Bahia século XIX: uma provincia do Império. Rio de Janeiro: Nova Fronteira. 1992.
TAVARES, Luis Henrique Dias. História da Bahia. São Paulo: Editora Unesp: Salvador, BA: EDUFBA, 2001.
Fonte - Ferreira Gomes
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